A maior cantora do Brasil sendo vaiada pela plateia é uma das cenas mais fortes do filme Elis. Com um roteiro bem elaborado, o diretor Hugo Prata apresenta Elis intensa em um filme intenso, com destaque para a completa entrega da atriz Andréia Horta ao papel principal.
Elis intensa em um filme intenso sobre a maior cantora do Brasil
Apontada como uma suposta falha por parte do público, a não totalização dos fatos é exatamente o que enriquece o roteiro.
Um filme sobre uma grande estrela não pode se resumir a uma cronologia rígida dos acontecimentos, o que o tornaria enfadonho.
Tampouco pode-se esperar que todos os grandes compositores com quem ela conviveu fossem retratados no filme.
Isso seria impraticável, considerando-se a diversidade de escolhas feitas pela própria Elis ao longo de uma carreira prematuramente ceifada pela angústia e solidão dos gênios, que tirou a vida da maior intérprete brasileira.
O show para os militares é repudiado pelos antigos fãs
Os episódios dramáticos, como a pressão que sofreu dos militares da ditadura, por ter se referido a eles como gorilas, resultou na repulsa por parte de um público que não conhecia o que estava por trás do show que ela foi pressionada a fazer pelos ditadores.
Elis foi retratada pelo representante dos ditadores como uma mulher de vida duvidosa, por ser desquitada.
O mesmo gorila, numa evidente chantagem, reclamou que ela escolhera uma música de Chico Buarque para seu repertório.
E, em tom claramente ameaçador, lembrou a Elis que ela era mãe de “um filho pequeno”, para então pressioná-la a fazer o show no evento apinhado de militares.
Elis chega ao Rio em busca do sucesso
Elis era uma mulher de temperamento forte, muitas vezes explosivo, como quando jogou no mar boa parte da coleção de discos do então marido Ronaldo Boscoli, ao descobrir que ele a estava traindo.
Com Cesar Camargo Mariano chegou a manter um relacionamento um pouco mais harmonioso, até que ele não suportou vê-la decaindo, abatida pelos vícios, num aparente comportamento de autodestruição.
A diferença entre ambos os parceiros era evidente.
Boscoli era mulherengo e desgarrado. Conhecido no meio artístico, era visto como o empresário que já havia namorado todas as mulheres do Rio de Janeiro.
Foi parceiro de Luis Carlos Miele na promoção de eventos. E chegou a se desentender com Elis quando ela estava em início de carreira e procurou a dupla para começar a se apresentar.
Irônico, chegou a apelidá-la de hélice regina, quando assistiu aos shows que ela apresentava num programa em parceria com Jair Rodrigues, no qual ela fazia movimentos exagerados com os braços ao interpretar canções de ritmo agitado.
Elis intensa num filme intenso de alegrias e tristezas
César Mariano, músico da melhor qualidade, exímio pianista, é retratado no filme como mais pacato e conversador.
Premiado no Brasil e no exterior, ele atuou como diretor musical, produtor e arranjador de Elis, excursionando com ela para shows.
Apelidada de Pimentinha, devido ao seu temperamento, Elis era um misto de brabeza e de meiguice com pessoas que ela admirava e com quem mantinha grande amizade.
Numa entrevista que não é mostrada no filme, certa vez Miele narrou uma grande emoção que teve ao assistir a um show dela.
De início, era como se ela tivesse ignorado a presença dele, o que o deixou acabrunhado.
No momento seguinte, do palco, Elis anunciou à plateia que iria homenagear um grande amigo que estava presente.
E começou a entoar a Canção da América, sucesso de Milton Nascimento, dirigindo-se a Miele: “Amigo é coisa pra se guardar… no lado esquerdo do peito…”
Miele contou que não conseguiu conter as lágrimas.
Elis retribui ao público os aplausos
Entre as várias cenas tocantes do filme estão aquelas em que ela aparece ao lado dos filhos, ainda pequenos, na área externa da casa onde moravam.
E quando faz um show de grande sucesso, após a pressão dos militares que provocou o desgaste de sua imagem.
Elis intensa é retratada em um filme intenso, sem narrativa linear, que poderia lhe dar a aparência de um documentário insosso.
De volta aos braços da plateia
Obviamente, nem tudo poderia ter sido mostrado. Mas, seguramente, alguns dos momentos mais importantes e mais impactantes estão presentes no filme.
Evitar a linearidade transformou a película num filme com aparência de qualquer filme bem feito, que poderia retratar a vida de qualquer personagem, verdadeiro ou fictício.
Um dos vários álbuns de Elis Regina tinha como título Falso Brilhante.
O filme Elis não é falso.
Mas é brilhante.
Elis pode ser assistido na Netflix e na Star Plus
Direção: Hugo Prata
Roteiro: Luiz Bolognesi, Hugo Prata e Vera Egito
Trilha sonora original: Otávio de Moraes
Elenco principal:
Andréia Horta: Elis Regina
Caco Cioler: Cesar Camargo Mariano
Lúcio Mauro Filho: Miele
Gustavo Machado: Ronaldo Bôscoli
Júlio Andrade: Lennie Dale
Ícaro Silva: Jair Rodrigues
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