Liberdade de expressão e censura

Liberdade de expressão é um tema que permanece na berlinda, ou seja: parece nunca sair de discussão. E não se pode esquecer, também, que a censura no cinema tem uma longa e complexa história que remonta aos primórdios da sétima arte. Desde os dias iniciais do cinema, cineastas enfrentaram desafios significativos relacionados à liberdade de expressão.

Esse debate sobre liberdade de expressão parece destinado à eternidade, por vários motivos. Um deles é a existência de duas vertentes que, certamente, dificilmente chegarão a um consenso: a dos que apontam que liberdade de expressão se aplica a tudo e tem que ser plena, e a dos que estão determinados a provar que o conceito não pode se confundir com liberdade de cometer crimes e de atentar contra a vida.

As redes sociais sentiram o aquecimento do debate diante da repercussão da série Adolescência, em que um jovem estudante é preso sob a acusação de ter assassinado uma colega de escola.

O crime que serviu de pano de fundo da série trouxe à baila a apontada influência que as redes sociais podem ter sobre a mente das pessoas, levando-as a cultivar preconceitos e até mesmo o ódio em razão do que se aponta como uma quase (ou supostamente infalível) lavagem cerebral sobre quem frequenta essas redes.

Em razão desses debates, surge no Brasil a intenção de regulamentar as chamadas big techs, sob o argumento principal de que tudo na vida é regulamentado em sociedade e não haveria sentido em deixá-las de fora, especialmente se elas podem influenciar a ponto de colocar em risco o direito fundamental à vida.

O próprio Google ilustra o poder dessa influência sobre as pessoas, destacando que as big techs se caracterizam pelo seu tamanho, poder e influência, uma vez que tais empresas influenciam tendências, ditam o ritmo da inovação tecnológica e moldam a forma como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos

Em contraposição, entra também em debate a censura, em suas diversas formas, que ao longo da história foi imposta não apenas por órgãos governamentais, como também por associações e pela própria indústria cinematográfica, que frequentemente optava pela autocensura para evitar represálias.

A censura pode ser política em muitos países e ocasiões

A censura atuando na moral e na política

No início do século XX, a censura era mais uma questão de moralidade do que de política. Muitos filmes eram criticados por retratar temas considerados inapropriados ou obscenos. Isso resultou na aprovação do Código Hays, um conjunto de diretrizes que regulamentava os conteúdos cinematográficos até a década de 1960. O Código proibia, por exemplo, a representação de comportamentos classificados como imorais, e a sua violação frequentemente resultava em boicotes ou proibições de exibição.

A transição para a liberdade de expressão mais ampla começaria a ocorrer com o advento de novos movimentos sociais durante os anos 1960 e 1970. Filmes como Laranja Mecânica, expondo críticas sociais e políticas, enfrentaram severa censura, mas também abriram espaço para debates mais amplos sobre o que deveria ser permitido nas telas. O objetivo de censurar muitos desses filmes era, frequentemente, proteger os valores da sociedade, mas também levantava questões sobre quem tinha o direito de decidir o que poderia ser visualizado.

Nos anos recentes, a censura no cinema continuou a evoluir, movendo-se para o ambiente digital, onde plataformas de streaming por vezes enfrentam sua própria forma de controvérsia. A censura agora pode se manifestar por meio de críticas do público ou de pressão social, com cineastas frequentemente lutando para equilibrar suas visões artísticas com as expectativas da sociedade. Assim, a história da censura no cinema apresenta um panorama fascinante, refletindo as tensões contínuas entre arte e liberdade de expressão.

Liberdade de expressão e cinema: um conflito contínuo

A liberdade de expressão é um dos pilares fundamentais das sociedades democráticas, permitindo que indivíduos e grupos apresentem suas ideias, opiniões e visões de mundo sem medo de repressões governamentais.

No entanto, essa liberdade frequentemente se depara com as restrições impostas por novas legislações em debate, um fenômeno que se intensifica em diversos contextos culturais e políticos. O cinema, como forma de arte e meio de comunicação, torna-se um campo de batalha nesse conflito, refletindo e contestando as normas sociais vigentes.

O cinema possui o poder de provocar debates e reflexões profundas sobre questões sociais, políticas e culturais. Filmes que abordam temas polêmicos, como desigualdade, sexo, religião e política, frequentemente enfrentam desafios relacionados à censura.

Esse princípio de liberdade de expressão permite aos cineastas explorar assuntos controversos, confrontando normas estabelecidas e ampliando a compreensão do público sobre diferentes realidades.

Exemplos notáveis incluem A Última Tentação de Cristo, de Martin Scorsese, e o já citado Laranja Mecânica, de Stanley Kubrick, que geraram intensos debates e tentativas de proibição devido ao seu conteúdo provocativo.

A presença dessas e outras obras cinematográficas no diálogo cultural é essencial, pois elas não apenas desafiam a censura, mas também destacam a importância da liberdade de expressão em um contexto mais amplo.

A capacidade do cinema de iluminar questões esquecidas ou silenciadas contribui para um diálogo mais robusto dentro da sociedade. Assim, o cinema atua como um espelho crítico que reflete as tensões entre a liberdade de expressão e as limitações impostas pela censura, enfatizando a necessidade de um espaço seguro para a criatividade e a expressão artística.

Essa dinâmica entre os dois extremos é um indicador das batalhas permanentes que moldam tanto o cinema quanto a própria sociedade.

A Última Tentação de Cristo enfrenta o debate sobre liberdade de expressão
A Última Tentação de Cristo

Impacto da censura na criação cinematográfica

A censura tem um impacto profundo na criação cinematográfica, atuando como um obstáculo significativo para muitos cineastas.

Os criadores de cinema frequentemente enfrentam limitações que afetam sua liberdade de expressão, levando-os a reavaliar suas narrativas e métodos de produção.

Essa dinâmica é particularmente visível em contextos onde as consequências legais ou sociais da expressão artística podem resultar em represálias, seja pela proibição de filmes, como a censura em regimes autoritários, ou pelo medo de reações negativas do público.

A autocensura torna-se uma ferramenta comum, onde cineastas, na tentativa de evitar possíveis controvérsias, alteram ou eliminam elementos de suas obras. Isso não só reduz a diversidade de histórias contadas, mas também empobrece a experiência cultural do público.

A ausência de vozes autênticas e experiências diversas, frequentemente resulta em narrativas que não refletem a verdadeira complexidade da sociedade, limitando assim o potencial transformador do cinema.

Relatos de cineastas que enfrentaram a censura revelam o peso dessas pressões. Alguns optam por abordagens subversivas, inserindo comentários sociais de maneira discreta, enquanto outros buscam plataformas alternativas para veicular suas obras, como festivais independentes que acolhem narrativas marginalizadas.

O resultado dessa luta contra a censura é uma catalogação de vozes que, apesar das adversidades, persistem em expressar suas visões artísticas.

Essas experiências não apenas evidenciam a resiliência dos cineastas, mas também destacam a importância de um ambiente livre de censura para a inovação e a evolução do cinema.

O diálogo sobre a censura e a liberdade de expressão deve ser contínuo, garantindo que os desafios enfrentados pelos cineastas não sejam em vão, mas sim catalisadores para um cinema mais inclusivo e representativo.

Assista a seu filme como em tela de cinema

O futuro do cinema e os desafios da censura

Nos anos recentes, o cinema tem passado por transformações significativas, impulsionadas principalmente pelas novas tecnologias e pela ascensão das plataformas de streaming.

Essa evolução não apenas afetou a forma como os filmes são distribuídos e consumidos, como provocou um debate crescente sobre a censura e a liberdade de expressão.

O acesso a uma diversidade de conteúdos, frequentemente não disponíveis em cinemas tradicionais, tem ampliado os horizontes para cineastas e espectadores, ao mesmo tempo em que levanta questões sobre os limites da expressão artística.

A distribuição digital permite que filmes independentes e com temáticas controversas alcancem públicos que, de outra forma, estariam distantes.

No entanto, isso não significa que a censura tenha perdido seu poder. As plataformas de streaming, na busca por agradar a anunciantes e diferentes audiências, podem optar por restringir conteúdos considerados sensíveis ou controversos.

Tal prática, embora possa ser vista como uma forma de autocensura, levanta questões sobre como a liberdade de expressão é interpretada e aplicada no contexto contemporâneo.

Além das plataformas, as redes sociais desempenham um papel crucial na disseminação de ideias e na mobilização de vozes. Por meio delas, cineastas e ativistas têm a capacidade de desafiar normas estabelecidas e gerar discussões sobre temas muitas vezes sujeitos a censura.

Entretanto, o ambiente das redes sociais também é propenso a reações instantâneas e polarizadas, o que pode criar um espaço de pressão para a conformidade, dificultando um debate saudável sobre a liberdade de expressão.

À medida que o cinema continua a evoluir, a interação entre liberdade de expressão e censura se tornará cada vez mais complexa.

É essencial contemplar como essas dinâmicas influenciarão a trajetória da arte cinematográfica e o que isso significa para a sociedade em geral.

A luta por um espaço seguro para a expressão criativa e a reflexão crítica torna-se mais pertinente à medida que novas plataformas e tecnologias emergem, colocando o cinema no centro de um debate cultural em constante transformação.

Sobre o Autor

Gerson Menezes
Gerson Menezes

O objetivo do Autor não é o de concentrar-se na linguagem rebuscada do tecnicismo cinematográfico, mas de apresentar o que há de melhor (ou de pior) na filmografia nacional e internacional, e concentrar-se no perfil dos personagens. As análises serão sempre permeadas pela vertente do humanismo, que, segundo o Autor, é o que mais falta faz ao mundo em que violência e guerra acabam compondo o cenário tanto dos filmes como da realidade de inúmeros países, entre os quais o Brasil.

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