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Vamos começar com um alerta: não se pode comparar um filme a um livro, porque são linguagens totalmente diferentes. A Menina Que Roubava Livros no nazismo que queima livros por si só já é uma simbologia.

A Menina Que Roubava Livros no nazismo

O forte em um livro é a palavra. Em um filme é a imagem. Mas A Menina Que Roubava Livros, transposto para o cinema, não teve como proposta levar ao espectador as imagens chocantes de todo o horror do nazismo.

Muitos, de tantos filmes sobre esse tema, se propõem a isso. Mas não este, especificamente, em exibição no catálogo da Star Plus.

É lógico que estão presentes cenas esparsas, em que a truculência dos nazistas é mostrada de forma até desproporcional ao horror que acontecia de fato.

O que fica evidente é que essa versão para o cinema quis dar ênfase à visão humanista, representada por uma menina cujas expressões simbolizam a sensação de profunda tristeza de uma criança por ter sido separada da mãe.

E de ser recebida por uma mãe adotiva que é fria a ponto de se mostrar desprezível na forma como se dirige à criança quando a recebe em casa.

A Menina Que Roubava Livros

A menina que roubava livros, no nazismo que os queimava

O contraste entre a imagem passada pela mãe adotiva que despreza os comunistas e os chama de imundos (como o fazem os nazistas) e de um pai que se mostra atencioso e até carinhoso com a menina, não é algo que não tenha sido intencional.

E novamente temos a diferença gritante entre um livro, que precisa expressar isso com palavras, e um filme, que tenta expressar a mesma situação com imagens.

Toda a simbologia da história, em si, está representada pela expressão facial da menina, que permanece muda até começar a conviver com Rudy, o amiguinho esperto e inteligente que a faz, finalmente, começar a se expressar.

A menina que roubava livros e o amiguinho

Pelo menos um pouco de infância ao lado do amiguinho Rudy

O filme tem como origem a obra de Markus Zusak, mas não se propõe (e nem seria possível) ser uma cópia do livro. E essa pode ser a razão de ter decepcionado os que antes leram o livro.

Liesel é a menina que tem que encarar o trauma de separar-se, à força, da mãe. E ver o irmão morrer numa viagem feita para uma troca que a nenhuma criança pode parecer natural ou desejada, especialmente em meio a uma guerra cruel e desumana. Como sempre é uma guerra.

A ênfase no aspecto humanista é, mais uma vez, impactante, na imagem de adultos e crianças obrigados a participar de cerimônias em que preponderam os discursos do representante nazista e as imagens da montanha de livros consumida pelo fogo.

E é nessa fogueira contra ideias e visões opostas que a menina vai roubar o primeiro livro após chegar à nova morada.

Ou pedi-lo emprestado, como ela diz. Embora não se peça emprestado algo que não se tenha intenção de devolver.

A menina que roubava livros e o judeu perseguido pelos nazistas

A menina que roubava livros luta para manter vivo o judeu perseguido pelo nazismo

Para quem apenas assiste ao filme pode ter sido decepcionante o fato de ele não apresentar o horror nazista em toda a crueldade que simboliza essa fase triste da história.

Que tantos querem, por incrível que pareça, ressuscitar.

E para quem leu o livro, a decepção passa a ser, por exemplo, a ausência de todos os detalhes que explicam o ressurgimento de Max, o judeu perseguido que, apesar das circunstâncias, colhe um destino que não seria crível numa época como aquela.

Outra simbologia marcante, quando se encara a temática puramente humanista, é a mudança do perfil da mãe adotiva, que começa a agir de forma diferente com o passar do tempo. E a partir da evolução dos fatos.

O terror nazista e novos pais sem a verdadeira mãe

A mãe adotiva muda de feição diante do horror da guerra

Quanto ao clima que podia se esperar do filme, a tentativa foi a de apresentar a narração na voz da morte, que nem de longe se propunha a substituir o horror nazista em toda a sua crueza.

Certamente, é a junção de tudo isso que leva o filme a se mostrar decepcionante para alguns espectadores.

Pelo que se propôs no roteiro, evidentemente. Pois estamos diante da impossível tarefa de fazer com que uma obra literária seja transposta para o cinema com tanta similaridade como os leitores possam desejar.

Essa transposição, dependendo da opção, pode até se tornar mais impactante e dramática, em imagens, do que em palavras.

Fica evidente, no entanto, que não foi essa a escolha do roteirista, da produção e da direção do filme.

Compreendida pelo pai adotivo

O papi compreensivo vê na menina uma princesa

De qualquer modo, embora nem todos se proponham a aprender, é um filme que não pode ser desprezado como mensagem de aprendizado sintetizada na frase emblemática sobre a evidente necessidade de sermos, ao menos e simplesmente, pessoas.

… Sem que percamos a humanidade, perda essa representada, em sua forma mais cruel, por todas as ideologias totalitárias das quais tantas supostas simples pessoas não conseguem se desgarrar.

Nem (o que é ainda mais grave) deixar de defendê-las para que (o que é mais ainda inaceitável) acabem se repetindo.

A menina que roubava livros tenta entender o que lê

Se nem isso conseguir passar, é porque A Menina Que Roubava Livros terá falhado em sua missão.

Não como livro, que não é no cinema.

Nem como filme, que não teria conseguido ser.

Mas cada espectador (insistimos) vai senti-lo a seu próprio modo.

Dependendo da sua própria vivência com o tema. Por palavras e imagens.



Direção: Brian Percival

Autor da obra original: Markus Zusak

Roteiro: Michael Petroni

Elenco

No elenco:

Geoffrey Rush: Hans Hubermann (pai adotivo).

Emily Watson: Rosa Hubermann (mãe adotiva)

Sophie Neélisse: a menina Liesel

Ben Schnetzer: o judeu Max Vanderburg.

Nico Liersch: o menino Rudy Steiner.

Sobre o Autor

Gerson Menezes
Gerson Menezes

O objetivo do Autor não é o de concentrar-se na linguagem rebuscada do tecnicismo cinematográfico, mas de apresentar o que há de melhor (ou de pior) na filmografia nacional e internacional, e concentrar-se no perfil dos personagens. As análises serão sempre permeadas pela vertente do humanismo, que, segundo o Autor, é o que mais falta faz ao mundo em que violência e guerra acabam compondo o cenário tanto dos filmes como da realidade de inúmeros países, entre os quais o Brasil.

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