Minha vida no cinema

Em matéria de cinema, até que sou uma pessoa de sorte. Porque passei boa parte da minha vida no cinema, desde quando ainda era garoto.

Morador de uma quadra em Brasília que ficava a poucos passos do antigo Cine Brasília, eu assistia a todos os então famosos Festivais de Brasília do Cinema Brasileiro.

Ainda menino, numa das sessões cheguei a ver, a duas fileiras de mim, uma estrelíssima da época: Leila Diniz (foto), de pé, falando com as pessoas ao seu redor.

Morei nessa quadra dos 8 aos 21 anos de idade, de modo que pude também testemunhar a sanha dos censores da época da ditadura.

Faz tanto tempo que não me recordo se foi na estreia de Macunaíma, de Júlio Bressane, que a censura se intrometeu em minha vida no cinema.

Aguardávamos a sessão começar, a sala já quase escura, até que um senhor se aproximou para avisar à plateia ansiosa que o filme ainda estava aguardando a liberação da censura. E que não era certeza ainda se seria exibido.

A quadra onde eu morava ficava a poucos metros de outro cinema, localizado na W3 Sul, uma sala que eu frequentava com assiduidade e que já não existe mais há muitos anos: o saudoso Cine Cultura.

Era para lá que eu ia assistir, já na pré-adolescência, aos filmes de Godard, um dos cineastas da minha preferência.

Eu me via fascinado com a leveza de suas personagens, de gestos vagarosos e macios. E cheguei a me inspirar (confesso) no título de um dos seus filmes (Duas ou três coisas que eu sei dela) para um dos meus livros.

Não foi plágio, eu juro. Apenas inspiração ao me recordar da minha frequência constante aos Festivais de Godard, que o Cine Cultura exibia de vez em quando.

E o livro, um dos meus romances que estão na Livraria Virtual Amazon, ganhou o título de Algumas coisas eu contei pra ela.

E tenho que admitir também que dois parágrafos do livro são, de forma explícita, inspirados em Godard, na descrição que eu fiz da personagem Dalila, o nome que escolhi para retratar uma das minhas paixões da época em que eu escrevi o livro:

Seus gestos eram tão macios que me lembravam os filmes de Godard, que eu assistia na adolescência.

Quando ela passava manteiga no pão era como uma cena de filme. Nem barulho fazia. Nem o ar se mexia. Era a hora em que eu me arrependia de não ter nascido pintor como o meu amigo que mora em Paris.

Este site nasce em homenagem à minha vida no cinema

Já vai longe a infância e a mocidade de cinéfilo, muita coisa se passou de lá para cá, hoje o cinema tem nova feição e resolvi homenagear a cinematografia de tantas décadas inesquecíveis com a criação deste site.

Não sou exatamente um saudosista. Mas que dá, dá, muita saudade das obras primas de cineastas como Luís Buñuel e o seu irônico e avassalador O Discreto Charme da Burguesia, ganhador do Oscar de melhor filme estrangeiro em 1973.

Em meio aos imprevistos risíveis que surgem durante a refeição dos comensais burgueses, impossível não dar gargalhadas quando surge a suspeita de que “las truchas estan podridas”. Entre outras passagens impagáveis do filme.

Não serei rigoroso a ponto de dizer que hoje não existem bons cineastas. Mas são em menor número, ouso afirmar, acrescentando que essa impressão é tão quantitativa quanto qualitativa.

Como pai dedicado, desafiei-me a assistir com meus filhos a uma película da série Velozes e Furiosos, o que me bastou em relação a essa série.

Quando meu filho mais novo estava com 10 anos de idade, provei a ele que eu era capaz de adivinhar, com facilidade, o desfecho das cenas dos filmes que costumamos assistir juntos.

Ele se convenceu de que eram películas que eu de fato não assistira até então, quando lhe expliquei que, para muitos filmes, Hollywood usa apenas uma fórmula.

É uma indústria que já produziu tantos filmes que começa a ter dificuldade de inovar. Usam as fórmulas que deram certo e variam apenas a forma como as histórias são contadas.

Mas quem sempre esteve atento a roteiros, aprende a desvendar esses desfechos. Antes que eles aconteçam, obviamente.

A grande questão é que, embora países como Coreia do Sul e Espanha (entre poucos) mostrem-se empenhados em renovar, não há indústria cinematográfica que tenha o poder de competir com Hollywood quando o quesito é espalhar filmes a granel pelo mundo.

Saudosismos não vão me intimidar, prometo, na apreciação que me empenharei em fazer neste site sobre os filmes assistidos.

Até porque, deixo para outras plataformas as análises mais técnicas e me concentrarei, sempre que isso for possível, na avaliação de personagens e na contribuição que os roteiros possam dar ao mundo, em termos de reflexão e – sobretudo – de ressurreição do humanismo, algo que anda tão em falta nesses tempos sombrios em que prepondera a violência sobre o amor e a guerra sobre a paz.

Que minha nova etapa de vida no cinema possa me proporcionar momentos deliciosos como os que eu vivi durante a infância e a juventude.

E que a chamada Sétima Arte demonstre força, coragem, ousadia e lucidez de modo a sensibilizar as pessoas para construírem um mundo melhor.

Para minha sorte. E para a sorte dos frequentadores deste site.