É preciso admitir: até mais ou menos a metade do filme, Amor e Outras Drogas parece insuportável. Não se torna nada espetacular daí por diante. Mas, ao menos, insere uma questão que deixa para trás a sensação de um filme meloso, reduzido à exibição repetitiva de um casal na cama em meio a cenas de sexo.
Amor e Outras Drogas parece insuportável até que novos dramas surgem
O título foi bem construído porque se apresenta como uma sutil referência à impressão de como as pessoas encaram o casamento e, em consequência, o amor, em tempos de tantos conflitos conjugais.
Ao mesmo tempo, insere o termo que não poderia faltar, uma vez que a trama gira em torno da indústria das drogas farmacêuticas, com sua disputa voraz por clientes.
Essa disputa se dá a partir de toda uma engrenagem persuasiva que se transforma, por sua vez, em luta ferrenha (frequentemente destituída de escrúpulos) em busca de primeiro lugar no pódio das vendas, independentemente dos chamados efeitos colaterais.
Amor e outras drogas da indústria farmacêutica
A trama se passa nos anos 1990, em que a Pfizer (presença nominalmente permanente no filme) lança a grande novidade: o Viagra, que se torna a tábua da salvação para os homens que sofrem com as dificuldades de ereção.
Nem todos os efeitos colaterais são mostrados (o que era de se esperar), mas o priapismo acaba acometendo o próprio protagonista, que vai parar no hospital, incomodado com a súbita ereção, incontrolável e prolongada, muito além do que seria normalmente suportável.
Amor e Outras Drogas começa com a tentativa do mulherengo Jamie Randall (após ser demitido como vendedor em uma loja de eletrodomésticos) de se dar bem na conhecida atividade daqueles engomadinhos que incomodam os pacientes à espera de uma consulta, invadindo os consultórios com suas maletas repletas de amostras grátis para convencer os médicos da eficácia das drogas.
Maggie vira o centro das atenções do mulherengo Jamie Randall
Entra em cena Maggie, a paciente precoce do mal de Parkinson que, após pedir a prescrição de remédios, se diz incomodada com uma estranha mancha no seio, que lhe parecia uma nódoa ou o indício de um mal que ela desconhecia.
O médico a tranquiliza, esclarecendo que se trata de uma simples picada de aranha.
Maggie percebe o olhar atento de Jamie no momento em que ela abre a blusa para exibir os seios para que o médico pudesse fazer o diagnóstico.
Numa cena bem clichê, no estacionamento do hospital, ela desfere a bolsa, violentamente, contra a cabeça de Jamie, repreendendo-o pelo fato de ele ter espionado os seus seios durante a consulta médica.
Quem está acostumado a esses filmes que tentam mesclar drama e humor, em meio a romances, sabe que aquele é o cenário perfeito para sinalizar que dali a pouco tempo surgirá um relacionamento. Ou um caso de amor.
Outros personagens vão aparecendo com mais frequência, como Bruce Jackson, um astuto conhecedor dos meandros da indústria farmacêutica.
E também – entre outros – o chatíssimo Josh Randall, irmão de Jamie, que vai morar com ele depois de ser, literalmente, enxotado de casa pela própria esposa.
E que acaba se intrometendo na relação entre seu irmão e a nova namorada.
Em cena o insuportável Josh Randall e suas manias
Além de intrometido, chorão e inconveniente, Josh é viciado em vídeos pornôs e demonstra sua incapacidade de vivenciar uma história real de amor.
Até a essa altura, o mal de que padece Maggie parece figurar em segundo plano. Ela se finge apenas de mulher interessada unicamente em sexo casual, quase que uma libertina somente em busca de prazer fácil com parceiros de aventuras passageiras em sua vida de mulher supostamente voraz e independente.
A partir da revelação mais evidente de seu mal neurológico é que tem início o verdadeiro drama que envolve uma mulher ciente das consequências que sua doença degenerativa representará em sua vida, a partir da progressiva evolução dos sintomas, cada vez mais agressivos.
Houve uma reação de público e de parte da crítica de que o desfecho mostra-se piegas ou se revela como lugar comum nas chamadas comédias românticas.
Começa que não se parece exatamente com uma comédia, já que as cenas pretensamente engraçadas não alcançam a comicidade pretendida.
E o final mesclando romance com drama não chega a ser totalmente inverossímil, exceto para as pessoas que, como já frisamos (e como bem insinua o título) reduzem o amor a uma droga.
Além disso, há o contraponto com o personagem que expressa, em linguagem rude, áspera e quase cruel, num diálogo com Jamie, a realidade inevitável do drama em que irá – seguramente – se transformar sua vida quando as consequências reais da doença de sua namorada começarem a surgir de forma mais agressiva e praticamente insuportável para quem não tem o verdadeiro sentimento do amor.
Amor e Outras Drogas: reflexões diante de uma realidade dramática
De um desfecho – como já dissemos – aparentemente inverossímil, ou mesmo piegas, como muitos assim o entenderam, Amor e Outras Drogas, que parece insuportável no início, tem ao menos o mérito de levar a uma reflexão.
Não é nenhuma obra-prima, nem representa uma daquelas películas que provocam frenesi nas plataformas de streamings ou imensas filas à entrada dos cinemas.
Mas nem de longe pode ser considerado um filme inútil, numa época de tanta falta de compaixão, amor e dedicação entre pessoas que colocam a superficialidade acima de realidades que nem sempre são fáceis de suportar.
Realidades que se tornam, na verdade, verdadeiramente insuportáveis quando não há um mínimo de solidariedade no momento crucial de enfrentá-las, como forma de aliviar o padecimento de quem se vê diante dessa dor real. Dor física, mental e emocionalmente demolidora.
Amor e Outras Drogas (Love and Other Drugs)
Ano de produção: 2010
Estreia: 2011
Roteiro: Charles Randolph, Edward Zwick
Direção: Edward Zwick
No Elenco:
Anne Hathaway: Maggie Murdock
Jake Gyllenhaal: Jamie Randall
Oliver Platt: Bruce Jackson
Gabriel Macht: Trey Hannigan
Judy Greer: Cindy
Katheryn Winnick: Lisa
Josh Gad: Josh Randall
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